Pode ser que alguns ainda se
surpreendam, mas nós humanos somos como qualquer outra espécie que
habita o planeta nas funções mais básicas e ordinárias de nossas
existências. A principal tarefa que nos cabe cotidianamente é a de obter
alimento suficiente à nossa própria sobrevivência. Assim mesmo, sejamos
mais ou menos inteligentes, teremos que comer hoje, amanhã e nos dias
vindouros de nossa limitada existência. Nada muito diferente do que faz
uma minhoca, um gambá ou um sabiá.
Esta é apenas uma entre as muitas
leis naturais a que estamos subordinados. O problema é que a ganância
ilógica e estúpida dos poderosos nos tempos modernos buscam colocar o
homo sapiens aquém e além do óbvio. Só assim poderemos entender a
inversão de prioridades ao colocar em risco a produção dos alimentos,
tal com, temos visto com certa frequência em situações alarmantes.
Preços cada vez mais altos
O mais recente relatório divulgado na
semana passada pela FAO, o órgão das Nações Unidas para a Alimentação e
Agricultura, revela que a elevação no preço dos alimentos chegou a
níveis críticos, ou melhor, desesperadores, principalmente para os
países pobres que necessitam importar alimentos para dar de comer às
suas populações.
Segundo revelam os dados da FAO, nesses
últimos meses os preços do trigo registraram uma alta estratosférica
entre 60% e 80%. O milho, um aumento de 40%. Uma nefasta combinação
entre aquecimento global e produção de energia a qualquer custo podem
estar entre os principais fatores causadores dessas altas. Afinal, as
quebras nas safras de dois gigantes na produção de grãos, Estados Unidos
e Rússia, ocorreram em virtude dos efeitos de secas prolongadas. Nunca é
demais lembrar que a alimentação por grãos, como trigo, milho e arroz,
representam a base da dieta de parte considerável da humanidade.
Mesmo assim e, infelizmente, o preço
desses alimentos tem estado em constante alta, pois além do prato dos
humanos, esses cereais alimentam animais e os veículos abastecidos por
biocombustíveis.
O relatório afirma que 22 países já
enfrentam uma crise prolongada com altos índices de fome mesmo antes
dessa forte alta. Portanto, além do agravamento da situação desses que
já enfrentam uma crise alimentar deve-se esperar que novos países venham
a se juntar a esse grupo de esfomeados.
O próprio Banco Mundial, na figura de
seu presidente Robert Zoellick, também manifestou preocupação com o
aumento da fome do mundo. Segundo ele, a elevação dos preços agrícolas
trará enormes consequências para países em desenvolvimento.
Outro problema apontado por economistas
da FAO é a especulação orquestrada pelos mercados futuros. “A
financeirização por meio de manobras especulativas contribui para elevar
os preços dos alimentos”, afirma a entidade.
Especulação, fenômenos climáticos
extremos e desvio da função primordial de dar de comer às pessoas, já
seriam razões suficientes para desequilibrar toda a oferta de alimentos
mundial. Mas ainda tem mais: a má distribuição!
Estudos feitos pelas Nações Unidas já
concluíram que existe alimento suficiente para alimentar toda a
população do planeta, o problema é que ele não chega onde mais se
precisa. E, claro que não poderia ser diferente, 98% dos que passam fome
vivem em países subdesenvolvidos.
Se os dados atuais da ONU são
alarmantes, o futuro parece trazer ainda mais preocupações. A ONG Oxfam
divulgou, também na semana passada, uma nova edição do relatório
(Clima Extremo, Preço Extremo). A situação da fome ainda vai piorar:
segundo a organização, “populações que hoje já passam dificuldade para
se alimentar se encontrarão em uma situação ainda pior nas próximas
décadas, comprometendo até 75% de sua renda na compra de comida”.
Cálculos da Oxfam estimam que os preços médios de alimentos deverão dobrar até 2030.
No Brasil, o problema é o desperdício
Quarto maior produtor mundial de
alimentos, o Brasil produz comida suficiente para alimentar toda a sua
população e ainda exportar excedentes. Mas além da má distribuição, um
dos maiores problemas do país é o desperdício. Dados da Embrapa estimam
em uma perda diária de alimentos na casa das 40 mil toneladas. Uma
quantidade suficiente para alimentar em torno de 19 milhões de pessoas
com três refeições por dia.
Estudo do Instituto Akatu divulgado no
caderno temático “A nutrição e o consumo consciente” nas diversas etapas
pelas quais o alimento passa antes de ser adquirido pelo consumidor
ocorrem perdas que perfazem essas milhares de toneladas de comida boa
que vai parar no lixo, sendo 20% na colheita; 8% no transporte e
armazenamento; 15% na indústria de processamento e 1% no varejo. Além
disso, devem-se levar em conta todos os recursos naturais que foram
utilizados para a produção desperdiçada desses alimentos.
Iniciativas sustentáveis
É óbvio também que tais ações devem
contar com a participação da iniciativa privada, fundamental para o
sucesso de uma política que vise o bem estar da população. As grandes
corporações produtoras de alimentos já possuem uma relevância tal que
suas ações para o bem ou para o mal impactam a vida de parte
considerável da humanidade.
Um exemplo interessante é o da empresa
Sapore, multinacional brasileira responsável pelo abastecimento de mais
de 1.100 restaurantes corporativos com cerca de 800 mil refeições
servidas diariamente e faturamento na casa do 1 bilhão de reais por ano
(dado de 2011).
Os 2 mil fornecedores cadastrados em
todo o país que fornecem e preparam os alimentos a serem servidos a
esses milhares de trabalhadores todos os dias precisam observar
critérios de sustentabilidade determinados no IOS (Inteligência
Operacional Sapore) que buscam, entre outros, a redução no desperdício
de alimentos, do consumo de água nas cozinhas e dos gastos com energia
elétrica e gás.
O uso de equipamentos de última geração
em espaços reduzidos de cozinhas de 40 m² também garantem eficiência e a
otimização dos processos na preparação dos alimentos.
Os restaurantes também contam com
campanhas educativas sobre alimentação saudável e controle do
desperdício. Enfim, essa é uma ação, entre tantas, necessárias para que
evitemos a perda absurda de alimentos.
É possível mudar, mas tem que ser rapidamente
Basear os investimentos em uma
agricultura sustentável com o incentivo aos pequenos produtores,
consumir mais produtos locais, melhorar a infraestrutura do transporte e
armazenamento para reduzir o desperdício e garantir o acesso da
população aos alimentos são ações que deveriam estar presentes em
qualquer plano estratégico de um país. Ainda mais se esse país for pobre
ou em desenvolvimento. Colocar todos os esforços e todos os setores na
busca desse equilíbrio é até mesmo uma questão de governabilidade.
O fato é que se deixarmos as coisas como
estão podem se esperar o registro de novas revoltas ao redor do mundo
semelhantes as que têm ocorrido cada vez com maior frequência em
diferentes regiões do planeta.
Se muitas dessas manifestações tinham,
umas mais outras menos, também como motivação a escassez ou a alta no
preço dos alimentos, o agravamento da situação não será bom conselheiro
na hora de pedir calma aos revoltosos. Afinal, se não for possível
comprar comida para colocar no prato dos filhos, não haverá bom senso e
bons argumentos capazes de evitar atitudes, no mínimo pouco civilizadas.
Até amanhã, amig@s!
Fonte: Mercado Ético
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